Quer ler este texto em PDF?

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

ALIMENTAÇÃO

Contam que o mundo comemorou neste outubro de 1990 o dia internacional de alimentação, certamente da alimentação racional, farta, higiênica, atentadora das exigências da natureza humana. Houve festas maravilhosas na Etiópia, nos miseráveis países africanos, na América Latina e nas suas encantadoras e nas suas encantadoras favelas, alegres e plenas de vida. No Recife, onde os meninos catam restos podres de comida nas latas de lixo, os fogos de artifício coloriram os céus. O presidente Bush discursou aos povos recomendando caviar e perus natalinos. Em Teresina, os restaurantes ofereceram banquetes opiparos aos milionários dos bairros de luxo, enquanto os populares espiavam de longe os manjares dos deuses deglutidos nas afetivas patuscadas. Pobre não come. As populações famintas se encontram diminuindo de tamanho. A ausência de nutrição correta embota a inteligência e priva a pessoa do civismo e da altivez.

Essas campanhas têm a finalidade de desviar a atenção das massas humanas miseráveis, que esquecem os padecimentos e as angústias por alguns dias na esperança de que realmente possam encher o bucho vazio. A publicidade oficialmente paga pelos governos engana os tolos e ignorantes, na matreirice subliminar para a conquista de consciências deformadas.

Alimentação é vida. Não se resume em entupir a pança de substâncias que nada revitalizam.

É alarmante a nossa situação em matéria de alimentação. E exclusivamente a isto se podem atribuir as consequencias devastadoras para o homem brasileiro, para o seu desenvolvimento e para a sua capacidade. A cor de nossa pele não responsável pelos nossos males, mesmo porque "há brancos que são mais escuros do que alguns negróides; o cabelo escuro e os olhos negros são comuns a todas as raças; encontra-se o mesmo indício cefálico em grupos das raças mais diversas; a mesma forma do cabelo existe entre grupos étnicos tão distanciados como os indígenas australianos e os europeus ocidentais; os grupos sanguíneos não definem as raças".

E se somos apenas vítimas orgânicas de um regime alimentar deficiente, cumpre-nos atenuar o seu cortejo maléfico, incrementado a nossa produção e reformando a nossa economia agrária, o que se obterá, como bem ensina Josué de Castro, com o aproveitamento de todas as terras cultiváveis circunvizinhas dos grandes centros urbanos, mecanização da lavoura, financiamento bancário da agricultura, intensificação do cultivo de alimentos, amparo e fomento ao cooperativismo, combate ao latifundiário e à monocultura.

"A fome e a doença são os únicos companheiros constantes da solidão forçada do homem brasileiro", inferiorizado por uma organização econômico-social defeituosa.

O homem brasileiro deve ser valorizado.

E queremos crer que estas palavras não se tornem mera frase sonora. Estas palavras devem receber um significado real no pensamento e nas ações quotidianas de todos os homens, mulheres e crianças deste país.

Não somos povos inferiores. Apenas nos falta combustível e ainda não resolvemos o nosso problema cultural.

Não somos brancos, nem pretos, mamelucos ou mulatos - somos todos brasileiros.

É para nós uma razão de orgulho que no Brasil todos sejam membros do mesmo corpo.

O preconceito nasce do erro e da ignorância.

Brancos, negros e mestiços - estudemos a grande pátria que os antepassados heroicamente defenderam, para que possamos compreendê-la e dignificá-la, num mundo livre.


A. Tito Filho, 20/10/1990, Jornal O Dia

Nenhum comentário:

Postar um comentário