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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

CARTA SEM POLÊMICA

Minha talentosa coleguinha de jornal "Diário do Povo". Cordiais saudações. Na edição de domingo, 16 deste dezembro natalino, li a entrevista que você fez com o ex-governador José da Rocha Furtado, e gostei das suas perguntas e das respostas do entrevistado, num trabalho bem feito, como se estivessem em inteligente pingue-pongue de Marília Gabriela. Antes, porém, do texto conduzido claramente, fez a prezada amiga uma espécie de introdução, aquilo que os velhos jornalistas como eu, o Araújo Mesquita, padrão de dignidade profissional, Deoclécio Dantas, lutador de muita altivez, chamavam de NARIZ-DE-CERA. E na dita e supradita explicação introdutória, a simpática confreira atesta: "Nos últimos quatro anos, o nome mais lembrado por deputados e políticos foi o do ex-governador rocha Furtado".

Nunca, caríssima repórter. Nos últimos quatro anos, 1987 a 1990, não me recordo dessa preocupação da fauna dos homens públicos do Piauí. Pelo contrário, o nome mais usado nos jornais, nos rádios e tevês tem sido o de Alberto Silva.

Adiante você observa e atesta: "Fora dos meios políticos, deputados como Eurípedes de Aguiar, Santos Rocha, Demerval Lobão e João Mendes promoviam sessões de tortura psicológica, na tentativa de intimidar Furtado...". Não, colega de rara acuidade. Fui testemunha ocular da história. Eurípedes Aguiar, Demerval Lobão e João Mendes não eram, nessa época, deputado, federais ou estaduais, e os três pertenciam ao mesmo partido do governante, a UDN, e defendiam rocha Furtado por todos os meios de que dispunham. Exercia o mandato de deputado o Dr. Santos Rocha, orador animado e causídico hábil e corajoso, e não me consta que ele promovesse sessões psicológicas para que se torturasse psicologicamente o governador, de forma que se praticasse a lavagem cerebral dos criminosos porões das polícias ditatoriais.

A campanha de que Rocha Furtado DAVA AZAR foi criada no jornalismo oposicionista. No tempo de Hermes da Fonseca, confrades de jornal e compositores carnavalescos atribuíam ao presidente da República a URUCUBACA, o mesmo que azar, fluido negativo que se ligava, em Teresina, também ao desembargador Cromwell de Carvalho, conterrâneo de rara dignidade moral.

A crença de que certas pessoas distribuem AZAR desde que passem por nós ou quando têm os nomes pronunciados, pertence ao povo em virtude de circunstâncias adversas ligadas por coincidências aos cidadãos que a maledicência humana pretende destruir ou levar ao ridículo.

Perto do fim da parte introdutória, a zangada coleguinha escreve: "Quem desfez as lendas que existem em torno daquele que seria o mais impopular dos governadores do Piauí são artigos de jornais cariocas e discursos na época pelos opositores".

As lendas se criam pela sabedoria popular. E sempre elas provocaram as mais extraordinárias obras da literatura universal.

Rocha Furtado foi ídolo dos teresinenses e ao seu lado, na defesa do seu governo estiveram famosos jornalistas brasileiros como J. E. de Macêdo Soares e Danton Jobim e parlamentares do tope dos senadores Luiz Mendes Ribeiro Gonçalves e José Américo de Almeida. A imprensa de todo o Brasil defendia o governante do Piauí tornando-o popularíssimo e cada vez mais apoiado pelos piauienses. Só a paixão política dizia o contrário, não creio que a coleguinha se sustente de atitudes passionais no seu jornalismo.

Noutro ponto do NARIZ-DE-CERA a prezada jornalista afirma que Rocha Furtado: "TROCOU ATÉ DE CIDADANIA - HOJE É MUITO MAIS CEARENSE DO QUE PIAUIENSE".

Rocha Furtado confessa que deixou o Piauí por causa das dívidas contraídas.

Buscou Fortaleza para recuperar as finanças domésticas. Resta saber se os cearenses que residem em Teresina trocaram de cidadania, pois a cidadania tem a proteção da soberania nacional, desconhecendo fronteiras entre as velhas províncias, ou Estados da Federação.

No fim a garota escreve: "Furtado não admite a comparação do seu com o atual governo".

Rocha Furtado procurou-me para me informar que nunca fez a afirmativa referida à jornalista entrevistadora.

Minha intenção nesta carta está no restabelecimento da verdade, uma vez que não me compete a defesa da política que os homens públicos realizam ou realizaram no Piauí. Interessa a todos a realidade dos fatos.


A. Tito Filho, 20/12/1990, Jornal O Dia