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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

INFLAÇÃO

Quando me entendi, vigorava no Brasil o padrão monetário chamado MIL RÉIS, denominação que nos transmitiram os portugueses. Não alcancei o vintém, correspondente à vigésima parte do mil-réis, nem a pataca, de valor fixado em 320 réis. Circulavam as moedas de metal seguintes: o tostão ou cem réis, e dez tostões valiam um mil réis; duzentos réis; o cruzado ou quatrocentos réis; a de quinhentos réis, amarelinha, e a de um mil réis, também da cor do ouro. Corriam também cédulas de variado valor.

Em 1942, Getúlio Vargas decretou novo padrão monetário, o cruzeiro, dividido em centavos. Eu me encontrava no Rio de Janeiro quando se deu a mudança. O mil-réis passou a denominar-se cruzeiro.

Nesta Teresina, em 1932, a gente comprava cinco bananas por um tostão e no Rio custava uma passagem de bonde, para longo percurso, a bagatela de 10 centavos. Por 10 centavos se comprava um jornal de 12 a 16 páginas.

O cruzeiro, no tempo do presidente Castelo Branco, transformou-se em cruzeiro novo e com o passar do tempo voltou a chamar-se cruzeiro, até que o presidente Sarney adotou o seu célebre cruzado que chegou a cruzado novo. Em março de 1990 voltava-se ao cruzeiro.

Interessante é que tais alterações na moeda se fazem por vontade presidencial, sem interferência do Congresso da República.

Durante muitos anos nunca ouvi falar de inflação. As mulheres referia-se, com a subida dos preços, a carestia, por mínima que fosse a alteração.

Durante cinco anos, no Rio, meu pai mandava quinhentos cruzeiros mensais, importância com que eu pagava a pensão de estudante, lavado e gomado, merendava, usava transporte, adquiria jornal e cigarros, ingressava em circos e teatros e ainda gastava com mulheres nos cabarés e com as namoradas de sorveterias.

Enfrentei a vida nas fases da mocidade e parte da maturidade e nunca ouvi falar de inflação ou li jornais em que se debatesse tal problema. A cousa começou ao que parece no governo de Juscelino, com a construção de Brasília, o maior elefante-branco do país, cidade malvada que se cerca das mais espetaculares favelas do planeta. Construída para quinhentos mil habitantes, já ultrapassou dois milhões de seres humanos.

A vertiginosa subida de preços prosseguiu nos governos seguintes e não esbarrou, se não nos dias fantasiosos do cruzado do presidente Sarney.

Inflação, deflação, recessão, choques heterodoxos, e quanto vocabulário que tudo batiza a incompetência dos homens que governam o país, sustentando verdadeiros polvos como as estatais e adotando empréstimos fabulosos, a juros exorbitantes, para a edificação de obras faraônicas, prédios de luxo espantoso, bem assim nas viagens de gastos absurdos com o objetivo de que dois governadores se abracem e se façam rapapés receptivos, como recentemente se verificou na visita de Bush ao Brasil, para os opiparos banquetes, enchedores dos bundulhos de comensais de peru e caviar, e das panças sacolejantes de uísque dos estranjas.

No fim de contas, os dois presidentes, com as técnicas avançadas de hoje, bem poderiam entender-se por telefone, onde o telefone [de] Collor receberia as ordens do chefão da violência internacional.


A. Tito Filho, 23/12/1990, Jornal O Dia

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