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quinta-feira, 3 de novembro de 2011

BAIXEZA

Faz anos acompanho a vida política piauiense. Desde os anos 47 dela participo como jornalista. Presenciei discursos ferozes nas praças públicas, em que adversários se censuravam de modo azedo e sem medidas. Por vezes se ouviam acusações de desonestidade por parte de um ou de outro dos candidatos. Assisti a duras pelejas e ouvi severos e ferinos ataques por força das paixões políticas. Rocha Furtado, Gayoso e Almendra, Pedro Freitas, Lustosa Sobrinho, Petrônio Portella, para falar de candidatos ao governo, usaram linguagem contundente nos comícios de praça pública. Mas respeitava-se a honra alheia e sobretudo a vida privada dos cidadãos. As mulheres, então, eram intocáveis, gozavam do mais amplo respeito, de quantos oradores deitavam falação nos palanques de propaganda partidária.

Em 1964, com o golpe militar derribador do presidente Goulart, suspenderam-se eleições diretas. Aos políticos se concederam apenas eleições para deputados e senadores e as do âmbito municipal. Os cargões de mordomias tinham titulares escolhidos pelos generais de plantão. A partir de 1982 deu-se o retorno à escolha direta do governador, e pelo menos no Piauí as ambições de mando promoveram as mais infames baixezas contra adversários. Inaugurou-se verdadeira linguagem mequetrefe, para gozo e alegria dos moleques de esquina, famintos de indignidades contra a honra de pessoas consideradas, até antes das candidaturas, como pessoas de inatacável compostura. Na campanha de 1986, a debocharia desconheceu  freios. Tisnava-se a personalidade das lideranças pelos meios mais nefastos. A honra alheia valia menos do que dez réis de mel coado. A praxe generalizada estava em azinhavrar mais do que tudo a pilhéria apalhaçada dos candidatos. O insulto constituía a essência da campanha. Respeitava-se, porém, a mulher-filha, a mulher-esposa, a mulher-mãe.

Conheci em Teresina um parente, primo legítimo de meu pai, chamado José Nelson de Carvalho. Caráter reto. Trabalhador. Sério e leal. Esposa de virtudes imensas. Lar cristão e sadio. Enfrentou dificuldades na vida e morreu pobre. A filha Carlota conseguiu emprego na administração do Piauí para ajudar a mãe. Conheci-a em Karnak, como recepcionista, modesta servidora, antes de casar-se com Freitas Neto.

Carlota passou a trabalhar na Universidade Federal do Piauí. Que mal há nisso? Quantos deputados estaduais, federais, senadores, políticos de diversas cores possuem esposas, sobrinhas, irmãs, cunhados e cunhadas, às vezes família completa ganhando os dinheiros da Universidade? Pois essa ilustre senhora, recentemente, foi apresentada num programa político como beneficiária de ato condenável, o de haver obtido um emprego na Universidade.

E assim se viu exposta aos apreciadores dessas explorações descabidas contra uma circunstância normalíssima na existência dos políticos piauienses.

Conheço os candidatos ao governo do Piauí. São pessoas de bem, sérias, capazes. Como todo ser humano, possuem erros, cousa naturalíssima nos que se dedicam à política e ao seu cortejo de paixões e emoções.

O triste nível dos programas gratuitos na atual campanha de governador tem a responsabilidade exclusiva do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí, constituído de homens dignos, e do Procurador da República, não menos em dignidade. O horário gratuito da justiça se destina ao debate de idéias e à apresentação de programas. Os ilustrados juízes e o vigilante procurador pensam de outro modo e o Colegiado passa a amparar e a proteger a mais grotesca e degradante campanha deseducativa de que se tem noticia. As coligações em luta chegam a contratar locutores inteligentes para o xingamento e o deboche, inclusive graciosa e educada jornalista. Sei que os referidos profissionais praticam o seu trabalho para ganho melhor, mas a justiça não devia permitir que os não candidatos se pronunciassem em lugar dos que deviam assumir as próprias responsabilidades, de peito aberto, sem subterfúgios.

Deixo sincero apelo aos 4 dignos pretendentes ao governo do Piauí, no sentido de que se  eleve o nível da campanha, pois cada qual deles tem formação espiritual para tanto.

Ou que se respeitem pelo menos as mulheres cuja dignidade moral está acima de tricas e futricas de campanhas do mais baixo teor educativo.


A. Tito Filho, 02/07/1990, Jornal O Dia

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