Quer ler este texto em PDF?

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

AINDA O MENOR

Condena-se de modo unânime o Estado brasileiro e a sociedade pela triste situação em que se encontram, por toda parte, meninos e adolescentes, abandonados à própria sorte, sem afeto, famélicos, dormindo ao relento, na prática do furto e da violência. O Brasil se divide entre pobres e ricos - estes uma minoria privilegiada, aqueles a quase totalidade, representados por certa classe média proletarizada e pelo operariado sob regime de permanente exploração. Na cúpula as lideranças representativas do governo. Compraz-se a minoria nas viagens de turismo, nas orgias de uísque e sexo, nas vestes milionárias para a futilidade vaidosa, nas recepções nababescas dos casamentos e dos aniversários de luxo, com o desperdício de milhões e milhões de dinheiros. De seu lado, o governo sustenta mordomias, dissipa nos banquetes, na profusão dos gastos com autoridades e familiares e nos maus exemplos da corrupção, do nepotismo e da impunidade. A televisão, instrumento em poder de empresas privadas a serviço de poderosos grupos econômicos e políticos, tem o objetivo fundamental da dissolução dos costumes morais e da vida espiritual, por através das cenas de adultério, de alcoolismo, de filhos esbofeteando e xingando pais, de devassidão nos gestos e nos trajes; ou tem a meta de provocar o medo e a angustia, mostrando crimes nefandos, estupros, desastres, deformações físicas, incêndios, quebra-quebra, a fim de que todos se desinteressem pelos tristíssimos problemas de um país explorado de todas as formas; e ainda tem o jornalismo televisado, como processo de propaganda, a filosofia de fazer que o brasileiro gaste ou a deturpação cultural pela linguagem malferida ou pelo culto no NU. Mas a televisão esconde a realidade da família miserável, da mendicância, da escola desaparelhada, de inescrúpulo de bancos insaciáveis, da comercialização do ensino, da prostituição desenfreada, de homossexuais nas altas e baixas esferas sociais. Em meio à degradação quase generalizada, a criança, o adolescente e o jovem, todos sem horizonte, sem teto, sem roupa, sem instrução, sem afeto, - e a eles os maus exemplos, os tristes exemplos dos que deveriam educá-los para a vida. Estas as razões veementes que condenam, no caso, a sociedade dos homens, mal organizada e sem justiça social, e condenam o governo, em todas as suas esferas, cujos chefes as mais das vezes se conduzem por enervantes personalidades e reprováveis omissões. A vida familiar se encontra em dissolução. Pais e filhos mal se cumprimentam no recesso dos lares. Maridos e esposas vivem na rua, rebentos também, ou em torno das lições novelescas televisadas, nos chamados horários nobres. Nada se lê senão tolices. Não se estudam fatores culturais. Tudo se negocia, até a honra. Loucos são os que pregam no deserto. Salvar o menor é, antes de tudo, dignificar a família, concedendo-se a esta as condições para auferir os bens essenciais da vida - a habitação humana, a educação, a alimentação, o trabalho valorizado, o lazer decente, a renda justa, como queria e do jeito que ensinou o santo padre João XXIII.


A. Tito Filho, 07/08/1990, Jornal O Dia

Nenhum comentário:

Postar um comentário